Depois de dois anos de operação, a Apprenty encerrou suas atividades. Fundada em 2022 por Marcela Teixeira, Mariane Tonello e Guilherme Antunes, a startup surgiu como uma plataforma de ensino técnico online voltada para a preparação de jovens para o mercado de trabalho. Em 2024, a empresa se reposicionou, passando a oferecer soluções para a gestão de colaboradores. No entanto, os planos não avançaram conforme esperado.
Agora leia o relato de Mariane Tonello
Empreender é uma aventura de altos e baixos com momentos bons e difíceis. Hoje, quero compartilhar a história da Apprenty e as lições que aprendi ao longo dessa jornada até a decisão de encerrar nossa empresa.
Por que compartilhar esta história?
Falar sobre fracasso não é fácil, mas é importante. No mundo do empreendedorismo, as maiores lições costumam vir dos desafios. Meu objetivo é ajudar outros empreendedores a enxergarem que não estão sozinhos e talvez evitar que cometam os mesmos erros.
As três fases da Apprenty
1. A ideia inicial (2022)
Em 2022, nos unimos com o objetivo de resolver um problema que acreditávamos estar sendo ignorado: a formação técnica e a inclusão de jovens no mercado de trabalho. Realizamos um processo longo de discovery e desenvolvemos uma POC gratuita, que interpretamos como validação suficiente para seguir em frente. Cheios de entusiasmo pelo futuro, cometemos nosso primeiro erro: confiar em uma validação superficial e investir todas as fichas antes de ter uma compreensão clara da dor e do mercado.
2. A captação e os desafios (início de 2023)
No início de 2023, alcançamos um grande marco: a captação da rodada pré-seed com anjos e VCs. Com o capital em mãos, acreditávamos que estávamos prontos para decolar. No entanto, ao longo do ano, enfrentamos uma série de desafios, incluindo obstáculos regulatórios, falhas na estratégia de go-to-market e desenvolvimento do produto, baixa demanda pelo que oferecíamos e desalinhamentos internos.
3. As incertezas e o encerramento (2024)
Iniciamos 2024 repletos de incertezas. Sabíamos que era necessário pivotar, e um dos cofundadores decidiu deixar a empresa. Após um novo período de discovery, e sempre com a preocupação sobre o impacto da nossa solução, optamos por desenvolver um produto focado no engajamento de colaboradores operacionais, utilizando gamificação e inteligência artificial.
Dessa vez, buscando corrigir o erro inicial, validamos a ideia vendendo o produto antes mesmo de desenvolvê-lo, acreditando que isso seria suficiente. Ainda que essas vendas iniciais tenham acontecido rapidamente, o que nos deu muita confiança sobre o produto que estávamos oferecendo, enfrentamos novamente dificuldades significativas, como desafios no go-to-market, obstáculos na construção do produto e uma velocidade de crescimento abaixo do esperado.
No quarto trimestre de 2024, tivemos que encarar a realidade: não havia sinais concretos de PMF e tração para o produto. Apesar de acreditarmos que as vendas B2B poderiam se tornar mais fáceis com os cases de sucesso que estávamos construindo, era improvável que atingíssemos o ritmo de crescimento necessário para justificar novas rodadas de investimento no curto prazo. E o caminho até o breakeven e um eventual exit parecia muito longo e incerto.
Depois de muita reflexão – e sofrimento – decidimos tomar uma atitude definitiva, arrancar o band-aid e encerrar nossas operações. Assim, fomos justos com nossos investidores e com nós mesmos, abrindo espaço para novos caminhos e projetos.
Principais lições aprendidas
- Validação vai além do discovery: O discovery serve para identificar potenciais problemas a serem resolvidos, mas só é possível validar o tamanho da dor e o willingness to pay vendendo de fato e para vários clientes. Além disso, evite fazer POCs gratuitas.
- Quem tenta vender para todos, acaba não vendendo bem para ninguém: Inicialmente, acreditávamos que escolher um setor ou nicho para focar o produto limitava o número de clientes potenciais, mas, na prática, foi justamente o contrário. Não conseguimos identificar nosso ICP e por isso não nos aprofundamos no entendimento da dor e necessidades, além disso não sabíamos quais canais de aquisição eram bons para nós, tornando o processo de venda bem difícil.
- Evite complexidade desnecessária antes da hora: Criamos uma infraestrutura complexa e cara para atender a uma demanda que ainda não existia. Isso resultou em um processo de desenvolvimento de produto demorado e trabalhoso. Hoje, com IA e ferramentas no-code, é possível desenvolver um MVP em poucos dias. Não faz sentido investir tempo e recursos em problemas que ainda não apareceram.
- Cuidado ao captar mais recursos do que você precisa: Captamos uma quantia significativa de investimento antes de validar adequadamente a dor e o mercado, o que na minha visão, acabou nos atrapalhando mais do que ajudando. Contratamos pessoas, construímos estruturas de produto e acabamos gastando tempo com coisas que não era as mais importantes naquele momento. Além disso, é natural que ao possuir um captable com investidores que colocaram recursos relevantes, os founders passem a considerar uma série de outros fatores no processo de tomada de decisão, que não apenas validar o produto (ou a dor). Antes da hora certa, pode acabar desviando a atenção de objetivos mais imediatos e fundamentais.
Reflexões finais
Doeu? Claro, doeu muito. A Apprenty era um sonho e foi difícil abrir mão disso.
Mas, depois de descansar um pouco a cabeça, sinto orgulho por toda a entrega e dedicação, e gratidão por tudo que aprendi e pelas pessoas que conheci nessa jornada.
Essa experiência me transformou não só como profissional, mas também como pessoa.